quarta-feira, 3 de setembro de 2008

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Escravos da ciência: da religião de Newton à religião de Capra, por Eduardo Nunes



De um sonho que teve, Saint-Simon, relata que Deus revelou-lhe uma nova doutrina: a religião de Newton. Essa doutrina, seria dirigida, por um conselho principal, composto por 21 eleitos, divididos em duas classes, sendo presidido por um matemático: na primeira classe, seriam 12 membros, distribuídos da seguinte forma, 3 matemáticos, 3 físicos, 3 químicos e 3 fisiologistas; 9 membros na segunda classe, comporiam 3 literatos, 3 pintores, e 3 músicos. O conselho dividiria a humanidade em quatro partes – inglesa, francesa, alemã e italiana (MATTELART, 2002).

O sonho de controle do mundo pela Europa, no século XIX, teria terminado em desastre com Napoleão preso e isolado em uma pequena ilha. No século XX, novas tentativas na Europa foram catastroficamente perpetradas por teorias supostamente científicas, seguidas pelos EUA, a partir da segunda metade do século, com as novas tecnologias de dominação.

Entre outras reflexões o mesmo Saint-Simon, acreditava que com o fim do sistema feudal e teológico o governo dos homens seria substituído pela administração das coisas, cabendo a uma parte importante dos industriais gerenciar as tais “coisas” e quase nada pelos “trabalhadores”. Apesar de tudo, essas idéias circularam pelos meios socialistas, inclusive, utilizadas pelo próprio Marx. Engano geral, sobretudo, para quem pensava que a administração seria uma forma neutra de organização do trabalho.

Um outro contemporâneo de Saint-Simon, Augusto Comte, criador da sociologia, depois de uma desilusão amorosa, propôs em 1849 a criação da Igreja Universal da Religião da Humanidade. Comte, para celebrar o acontecimento, realizou o casamento de dois proletários, seguindo o novo rito. Acreditava que o progresso é o desenvolvimento da ordem e que o desenvolvimento humano se tornava cada vez mais religioso. Também ele, acreditava que o estado positivo das sociedades seria alcançado graças ao desenvolvimento científico e industrial.

Mais de um século após essas idéias positivistas um físico, Fritjof Capra (2003), nos anos 1970, desenvolveu pesquisas relacionando o pensamento científico, a física quântica, de sua época com a filosofia e o misticismo oriental (taoísmo, budismo). Para surpresa geral, essa nova perspectiva, ao contrário das anteriores, desacreditava a ciência em seu aspecto de estar voltada para os interesses da humanidade. .
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A crise ecológica global que já se antevia desde a época das bombas atômicas lançadas sobre o território japonês, os problemas da contaminação das primeiras centrais nucleares, o uso indiscriminado de veneno (químicos) na agricultura e as novas e potentes armas de destruição em massa, levantaram os protestos em todos os lugares, nos novos movimentos sociais, no meio acadêmico e entre os mais perplexos habitantes do planeta que diretamente sofriam os efeitos desastrosos do avanço da ciência.

Capra alertava para os efeitos do uso de tecnologias nuclear, militar e não-militar, atribuindo ao fator humano a inevitabilidade de acontecer acidentes. O plutônio esclarece esse autor, em homenagem ao deus grego do inferno Plutão, se for introduzido uniformemente 500 gramas “poderiam induzir potencialmente o câncer pulmonar em todas as pessoas do nosso planeta” (p. 238). Acrescenta ainda, que como não existe tecnologia segura, sempre um pouco de plutônio se escapa quando é manipulado.

Grande defensor das tecnologias alternativas e adotadas em pequena escala, a exemplo, dos coletores de energia solar, geradores eólicos, lavoura orgânica, produção e processamento regional e local de alimentos e reciclagem de produtos residuais, Capra, ao entender que o indivíduo ao estar vinculado ao cosmo como um todo acredita que essa nova ciência com sua perspectiva ecológica, se torna verdadeiramente espiritual.

Agregada a essas idéias, Capra, assinala, a importância dos movimentos de participação dos trabalhadores e da autogestão para a reorganização da sociedade. Defendendo o princípio de pensar globalmente e agir localmente, apresenta a possibilidade de insistirmos nas experiências alternativas societárias no mundo, desde o modelo chinês de desenvolvimento comunitário auto-suficiente, os estilos de vida tradicionais existentes em grande parte do mundo, e as experiências históricas de autogestão em diversos países.

Compreende-se que essas experiências e setores da economia informais, cooperativos e não-monetarizados, contrapõem-se às formas atuais dominantes de ciência, tecnologia e organização social.

Referências:

MATTELART, A. História da utopia planetária: da cidade profética à sociedade global, Porto Alegre, Ed. Sulina, 2002.

CAPRA, F. O ponto de mutação: a ciência, a sociedade e a cultura emergente. São Paulo: Cultrix, 2003.

3 comentários:

Lucas disse...

o/ viva o capra! E enquanto isso, o PAC privilegia o investimento nas obras faraônicas, grandes usinas, grandes impactos. uma pena.. uma contradição com a urgência dos nossos dias..

Anônimo disse...

essa é a fraternidade branca..
pior, bem pior do que a irmandade dos gordos felizes!!!!!

Anônimo disse...

O egoísmo é a religião dominante cujo grande Deus é o capitalismo. Então vamos todos para o inferno! Viva a autogestão!

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