segunda-feira, 4 de agosto de 2008

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Entrevista sobre O Inimigo do Rei



A entrevista foi feita por Moésio Rebouças, anarquista de São Paulo, ao participante deste blog, Carlos Baqueiro, para a Agência de Notícias Anarquistas.

Ai vai parte do material produzido por Moésio. Na quarta-feira e sexta-feira faremos a postagem do resto da entrevista.


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Ousado, irreverente, polêmico, criativo, contundente, bonito, autogestionário, visionário, anárquico. Esses eram alguns dos “ingredientes” do jornal “O Inimigo do Rei” (1977-1988). Talvez, um dos jornais mais marcantes da história da imprensa alternativa brasileira.

Recentemente, o baiano Carlos Baqueiro, juntamente com Eliene Nunes, lançaram o livro “O Inimigo do Rei – Imprimindo Utopias Anarquistas”. Na entrevista a seguir, Baqueiro, fala um pouco mais dessa experiência de comunicação autogestionária, onde o “jornalista também era o jornaleiro”.


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Como foi escrever o livro “O Inimigo do Rei – Imprimindo Utopias Anarquistas”? Tenho que te contar que esse jornal me marcou bastante, principalmente os primeiros números, o final nem tanto, acho que já tinha perdido o fôlego. Mas considero esse um dos melhores impressos alternativos já editados no país. Será que a "qualidade" desse jornal se deve ao fato de que ele era feito por jornalistas? (risos).

Cara, não foi só a você que ele marcou não. Conheço gente de Rondônia, da Paraíba, do Ceará, de Santa Catarina e tantos outros lugares que ainda hoje se lembram de textos do jornal que marcaram suas vidas. O jornal por menos organizado que pudesse parecer conseguia ter uma distribuição inacreditável por todo o país. Antonio Mendes, um dos fundadores do jornal, fala em entrevista que ia visitar os amigos e parentes no Ceará e levava uma boa quantidade de jornais deixando pelas cidades por onde passava.

Mas não acho que o fato dele ter tido a contribuição de jornalistas tenha sido a única causa da boa “qualidade” do jornal. Primeiro porque o termo qualidade de um jornal reconhecido hoje em dia não tem nada a ver com a qualidade de que estamos falando. Quando alguém tinha coragem de mandar textos para o jornal ninguém estava esperando que este texto fosse embasado por teorias iluminadas, ou que fosse uma obra subtraída de qualquer erro de gramática.

O que se esperava era a militância que vinha junto com o texto. Que todos estivessem imbuídos de fazer tanto o trabalho intelectual como o trabalho de transpiração, pichando os muros com propaganda anarquista, colando cartazes de madrugada com as capas do jornal, fazendo manifestações libertárias em frente a teatros, cinemas etc.

Já fazia algum tempo que eu tinha esse projeto de falar do jornal "O Inimigo do Rei". Já em 1997, consegui, com o apoio de Berla e Tavares, que também faziam parte da Associação em Prol do Pensamento Libertário (APPL), e viajaram para o Rio de Janeiro, fazer uma entrevista com Renato Ramos e outra com Tangerini. Pena que a segunda entrevista ficou impossível de ser ouvida e transcrita devido à interferência no áudio (e até hoje não consegui mais falar com o Tangerini).

Quando tive que fazer o Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) para me formar na faculdade de jornalismo, no final de 2007, a idéia ressurgiu, e o resultado foi um livro, publicado com o auxílio da Editora Achiamé e um vídeo-documentário.

Para quem não conheceu, de forma resumida, o que foi o jornal “O Inimigo do Rei”? Quando ele surgiu, periodicidade, tiragem... É um absurdo dizer que essa publicação esteve à frente do seu tempo, principalmente pelas temáticas abordadas?

"O Inimigo do Rei" foi um jornal anarquista. O seu primeiro número foi publicado em outubro de 1977, ainda durante o período da ditadura militar. Não tinha uma periodicidade muito regular. Durante a sua existência, entre 1977 e 1988, em alguns anos o jornal saia trimestralmente, em outros anos nem mesmo uma edição era publicada. Algumas das primeiras edições chegaram a ter 20 páginas, outras apenas 8.

Aqui em Salvador já ouvi entrevistados dizendo que se vendeu até 2.000 exemplares de uma edição. O anarquista paulista José Carlos Morel afirmou que em São Paulo uma das edições (com Elba Ramalho na capa) conseguiu vender 4.000 exemplares.

Ele surgiu a partir da união de alguns estudantes da Universidade Federal da Bahia (UFBA), como herança de pequenos informativos estudantis mimeografados, como “O Fantasma da Liberdade”.

Segundo Ricardo Liper (um dos fundadores do jornal na Bahia) o jornal era uma espécie de “O Pasquim”, só que bem mais radical nas suas críticas sociais. Acho que foi isso mesmo. Ele foi tanto de seu tempo, acompanhando as necessidades de indivíduos de se inserirem no mundo da política (como tantos e tantos outros jornais alternativos da época), quanto saiu desse tempo, ultrapassando a conjuntura.

Assim ele discutiu a situação dos prisioneiros comuns, quando todo mundo só falava de prisioneiros políticos; ele falava abertamente de aborto, racismo, e sexualidade, quando grande parte dos outros alternativos se preocupavam apenas com o cotidiano político e econômico do país, de uma forma macro.

Falando em Elba Ramalho, outros artistas “conhecidos” também ocuparam as páginas do jornal, como Zezé Mota, José Celso Martinez, Valter Franco... Aliás, o anarquista e cantor baiano Raul Seixas nunca foi entrevistado pelo jornal, não?

Caetano, Gil, Reichembach etc. Tem uma frase de Jô Soares em um dos últimos números do jornal dizendo que todo artista deveria ser anarquista, para não querer fazer propaganda de ninguém durante as eleições (com aquela roupa de rei anão). (risos)

Existe uma foto "andando" por aí em que Raul Seixas (já bem fraquinho, antes de morrer) usa uma das camisetas de nossa "grife", fazendo propaganda do voto nulo.


Continua na Quarta-Feira...

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