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Por uma Educação Transformadora, por Carlos Baqueiro
Por uma Educação Transformadora, por Carlos Baqueiro
Há milhões de anos o ser humano se preocupa em transferir experiência e conhecimento aos seus descendentes. Afinal de contas o somos seres de cultura. E essa cultura só existe historicamente porque as pessoas conseguem, através de sua linguagem, mantê-la e transforma-la, dialeticamente, no decorrer de sua vida no planeta.
Nas sociedades ditas primitivas a função de transferência de saber era de todos os indivíduos. A transferência se dava no dia a dia das pessoas, sem que houvesse alguém ou algum lugar que limitasse essa transferência. Alguns dos seres humanos conseguiram sistematizar essa forma de transferência. Deram consistência e direção a ela e possibilitaram a existência do que podemos hoje chamar de Educação.
Sacerdotes, reis, filósofos, conseguiram através de seu esforço intelectual construir uma arte/ciência de transmissão de saber, e, a partir deste saber, conseguiram deter e manter também o poder político dentro da sociedade em que estavam inseridos. E do poder político ao poder econômico. Mas somente na Idade Média, na Europa, a educação se torna um produto da Escola. A atividade de ensinar passou a desenvolver-se em espaços específicos, cuidadosamente isolados do mundo dos adultos e quase sem qualquer relação com a vida cotidiana.
Durante séculos este tipo de educação ficou reservado aos nobres e religiosos, e posteriormente, à burguesia que, na medida de sua ascensão, exigia os mesmos privilégios que detinham os aristocratas. Como os privilégios não chegavam a todos, a maior parte da sociedade não tinha qualquer vantagem em todo desenvolvimento levado pela educação. Na realidade todo, ou quase todo, desenvolvimento na Educação, foi em detrimento da maioria dos indivíduos.
Muitos não se resignaram a aquele estado de coisas. O anarquista russo, Mikhail Bakunin, em meados do século XIX, atacava aquele formato de educação:
A primeira questão que temos de considerar hoje é esta: Poderá ser completa a emancipação das massas operárias enquanto recebam uma instrução inferior a dos burgueses ou enquanto haja, em geral, uma classe qualquer, numerosa ou não, mas que por nascimento tenha os privilégios de uma educação superior e mais completa? Propor esta questão não é começar a resolvê-la ? Quem souber mais dominará naturalmente a quem menos sabe e não existindo em princípio entre duas classes sociais mais que esta só diferença de instrução e de educação, essa diferença produzirá em pouco tempo todas as demais e o mundo voltará a encontrar-se em sua situação atual, isto é, dividido em uma massa de escravos e um pequeno número de dominadores, os primeiros trabalhando, como hoje em dia, para os segundos.
Movimentos populares, sindicatos, entre outros, se mobilizaram e chegaram até a criar suas próprias escolas. E não só escolas, mas teatros e universidades, e toda uma gama de locais e organismos que tentavam criar uma nova cultura, transformando a existente em alguma coisa mais descentralizada e democrática.
A burguesia de uma forma mais inteligente que a aristocracia sabia que aquele foi o mesmo caminho que ela tomou para ascender politicamente. Formar sua própria cultura. Portanto seria imprescindível criar instrumentos que dificultassem e anulassem aquela ascensão das classes trabalhadoras.
Desde a Revolução Francesa a burguesia faz surgir as suas escolas públicas. Os ingleses abriram suas escolas também no século XVIII. Napoleão vai dar uma face final a aquela forma institucional. Naquelas instituições os pobres ignorantes seriam socializados, isto é, seriam “educados”, para tornarem-se bons cidadãos e trabalhadores disciplinados.
O ensino público, gratuito e obrigatório, patrocinado por Estados Burgueses, foi visto como a melhor maneira de garantir a democratização do conhecimento. O canto da sereia foi ouvido por aqueles mesmos que diziam defender os direitos do povo. E tanto em regimes ditatoriais, como na Alemanha nazista ou na União Soviética, quanto em regimes ditos democráticos, como nas “nossas” democracias ocidentais, as escolas começaram a trazer e fortalecer o germe do controle social.
William Godwin, filósofo inglês, já em 1793, temia por isto, mas poucos lhe deram ouvidos. Em seu livro, Investigação Acerca da Justiça Política, ele denunciava:
... todo projeto nacional de ensino deveria ser combatido em qualquer circunstância pelas óbvias ligações com o governo, uma ligação mais temível do que a velha e muito contestada aliança da Igreja com o Estado. Antes de colocar uma máquina tão poderosa nas mãos de um agente tão ambíguo, cumpre examinar bem o que estamos fazendo. Certamente que o governo não deixará de usa-la para reforçar seu próprio poder e para perpetuar suas instituições.
Porém, mesmo depois de 200 anos de estabelecido o controle estatal e autoritário, as vezes, quase imperceptível, dentro da sociedade, ainda é tempo de colocarmos um pé atrás quanto a uma educação monolítica, seja estatal ou privada.
O que devemos fazer, é nos por de pé e trabalhar por um formato educativo que permita a todos, educandos e educadores, transformarem as escolas onde vivem boa parte de suas vidas, em locais de alegria e felicidade, com todos em busca de uma vida melhor para toda a população.
Um comentário:
Triste futuro, pois é difícil enfrentar tantos meios de controle, ainda mais sendo imperceptíveis para maioria das pessoas.
Excelente texto.
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